domingo, 21 de setembro de 2014

O paradoxo no bdsm

Com o fim da relação d/s chegou ao fim também a minha submissão. Não tenciono definir-me novamente como submissa, digo-me apenas kinkster! Na verdade acho que o bdsm funciona apenas na teoria, na prática há demasiados paradoxos. 

Na teoria dá-se muita importância ao SSC, praticamente é o alicerce desta forma de ser/estar mas, na prática, o bdsm pouco ou nada tem de são, seguro e muito menos de consensual. Quando se inicia uma relação d/s há sempre, ou quase sempre, uma espécie de contrato entre ambos os intervenientes. Definem-se os limites, as práticas, os gostos, os objetivos, a conduta que se espera do outro... e acreditamos que estamos seguros, que não vai acontecer nada que não desejemos. Este é o primeiro erro.

Logo após a aceitação por ambos do que ficou estabelecido no contrato...o paradoxo começa. Não é preciso esperar muito tempo para perceber que afinal as coisas não são tão lineares como inicialmente pareciam. Primeiro porque nem tudo é discutido aquando o contrato, segundo porque mesmo o que é dito pode ser interpretado de maneira diferente por cada um, terceiro porque os intervenientes são humanos (o que pode parecer bem na teoria pode-se tornar angustiante na prática). Pode ser necessário um ajuste ao contrato, mas...é difícil que ocorra.

Dominador que é dominador (ou que tem a mania que o é) não cede, acha que ceder mostra fragilidade e isso não vai bem com a pose que pretende manter. Além do mais à sub cabe-lhe submeter-se, e se fosse fácil não era submissão, Lá se vai a parte do consensual! E pior, é que parece ter lógica, se o dever da sub é servir e submeter-se ao outro...porque há-de achar que a sua vontade tem importância? Ou é sub ou não, não há terceira hipótese.

Os limites, bem esses, em bdsm são para ser ultrapassados. Não é esse o grande feito do bdsm? Ajudar a sub a crescer e a tornar-se uma pessoa melhor? Nunca percebi bem como entregar o meu corpo ao chicote, em ficar marcada pela cana, até o sangue aparecer, contribuía para fazer de mim uma pessoa melhor. Na realidade acho que são apenas termos demasiado subjetivos, às vezes até me parecem isentos e vazios de significado, afinal de contas que entendem os entendidos por "crescer" ou "tornar melhor"? Acho que a leitura, por exemplo, teria contribuído mais para o meu crescimento como pessoa. Mas então se os limites são para ser quebrados porque nos damos ao trabalho de os fixar?

Quanto às práticas, que interessa o que a sub gosta ou quer experimentar? A maior parte dos dominadores concentra-se no spanking, satisfazendo o seu sadismo, e agora, nos mais recentes, nas agulhas e na cera. Acho os dominadores, por norma, pessoas com pouca imaginação ou então demasiado preguiçosos para pensarem em coisas alternativas. Tenho a dizer que quando é sempre mais do mesmo...a sub aborrece-se. No meu caso particular, quase tudo o que disse querer experimentar...continuo sem experimentar! Sempre que dizia ter gostado de algo...não voltava a repetir! Mais uma vez é a vontade do dominador que prevalece, mais uma vez lá se vai o consensual.

Outra prática interessante é o mind-fuck, embora não esteja ao alcance de todos. Esta nada tem de sã. Não vamos brincar um bocadinho com o cérebro da sub, baralhá-la e depois confortá-la. Não, o interessante é deixá-la para sempre baralhada. Induzir algo no seu cérebro, esperar pela reacção e depois usá-la contra a sub, podendo não ser de imediato. O mind-fuck pode ser de tal maneira agressivo que a sub muitas vezes acaba por admitir o impensável, confessar o que não existe, e depois...bem demasiado tarde, agora que foi admitido/aceite há que prová-lo. Era "só" um jogo que passa a ser real. Quantas vezes quebrei durante o jogo psicológico, quebrar mesmo, ao ponto de não ser capaz de reagir, de raciocinar, ou tão somente me reconhecer... Prática saudável? Não! Ainda hoje guardo mazelas no meu cérebro à custa da perversão do outro. Em vez de me libertar acabei por ganhar medos e fobias! Consensual? Não, se o fosse não teria o mesmo peso/efeito.

Quanto à conduta, também ela é variável, depende do momento, da altura, e das pessoas presentes. O que hoje é amanhã pode não ser, porque só não muda de opinião quem é burro! Da sub é esperada a verdade e só a verdade, no entanto do lado do dominador a mentira está muitas vezes presente, não fizesse ela parte da manipulação. A certa altura o melhor para a sub é estar caladinha e quietinha num canto, não vá aborrecer o mestre mas depois...bem depois afinal a sub é aborrecida porque não interage, porque não dá pica!

Por tudo isto e muito mais...me ausento da minha submissão, o que sempre vivi nas minhas fantasias não é praticável. Muito menos quando se aprende a amar quem nos domina.

2 comentários:

  1. Bom dia Ana. Li o teu texto com toda a atenção e carinho que me mereces. Percebo o teu desabafo mas não posso concordar contigo. O BDSM não é um paradoxo, ou não tem que o ser. Tiveste azar com o dominador que o teu coração escolheu. Acontece. Tal como tb acontece nas relações ditas baunilhas. Claro que numa relação D/s tudo é mais intenso, logo todos esses sentimentos tomam proporções ainda maiores.
    Mas não te esqueças que não é por morrer uma andorinha que acaba a Primavera ...e
    Um dia encontrarás alguém que saiba valorizar a tua entrega!! Bj

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    1. Vadia, Obrigada pela força e pelo carinho, Concordo quando dizes que em bdsm tudo é mais intenso, pelo menos a eum o vive com entrega e sinceridade. Claro que nas relações baunilhas também há lugar ao "desencanto" e à manipulação mas...pelo menos nestas podemos questionar e argumentar, não é exigida a confiança cega...

      Bem sei que a primavera não acaba com a morte de uma andorinha mas...para a andorinha não volta a haver primavera, nem verão, nem...

      Beijinhos e obrigada por continuares desse lado.

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