Há momentos em que me sinto entre a espada e a parede e tenho de decidir se me deixo ficar, sabendo que a espada vai continuar a trespassar-me lentamente, ou se faço um último esforço para impedir que o sofrimento continue.
Eu sei que à medida que a espada passa pelo meu corpo a dor vai ser cada vez mais acutilante. Não posso ficar à espera que a morte chegue para acabar com o meu sofrimento, tenho de agir. Se vou morrer ao menos que seja com orgulho, sentir-me-ei mais tranquila se souber que fiz tudo para continuar viva. Eu mereço respeito até no momento da morte.
Olho para o meu carrasco e não consigo perceber o que pensa cada vez que desliza a espada um pouco mais para dentro de mim. Não sei se a situação lhe dá prazer ou se simplesmente cumpre o seu dever, mas sei que vai continuar e nada do que eu diga o vai fazer parar. Talvez até se reveja como o meu salvador, talvez pense que preciso de morrer para depois poder ressuscitar das cinzas e ser uma pessoa melhor. Mas independentemente do que ele pensa ou sente a vida é minha, sou eu quem sente a dor, e sou eu que tenho de acabar com o sofrimento.
Num rasgo de lucidez, e com as forças que ainda me restam, consigo libertar as minhas mãos e tento afastar a espada. Não consigo. O carrasco tem mais força que eu e não se deixa mover pelo meu último esforço, continua irredutível. Percebo que independentemente do que eu faça vou morrer e por isso...agarro na espada e com toda a convicção puxo-a para dentro de mim. A lâmina corta-me as mãos, o sangue começa a escorrer, sinto-me fraca mas não a largo. Inspiro fundo e dou o golpe de misericórdia.
Meu coração, que antes estava agitado, acalma-se e de repente deixo de sentir dor. Fecho os olhos e abraço o momento. Sou de novo livre.
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